sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Escritura reconhece união afetiva a três

O colossal reconhecimento da união estável homoafetiva, corroborada com cerne no direito de ser feliz, no direito de ter sua afetividade salvaguardada face a um ordenamento jurídico-social descriminador, irrefutávelmente foi um indelével avanço.

O marco histórico: Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, documento esse de 4 de julho de 1776, preconiza:

consideramos estas verdades por si mesmo evidentes, que todos os homens são criados iguais, sendo-lhes conferidos pelo seu Criador certos Direitos inalienáveis, entre os quais se contam a Vida, a Liberdade e a busca da Felicidade.

O subsequente passo progressista, corresponderá ao reconhecimento da união estável entre “corações” que amam verossimilmente, assim como qualquer ser humano, no entanto, com a especificidade de mais de um ser. Aos conservadores e religiosos inflexíveis de plantão, este é o “clamor” dos costumes, ecoando no Direito:


Foi divulgada essa semana uma Escritura Pública de União Poliafetiva que, de acordo com a tabeliã de notas e protestos da cidade de Tupã, interior de São Paulo, Cláudia do Nascimento Domingues, pode ser considerada a primeira que trata sobre uniões poliafetivas no Brasil. Ela, tabeliã responsável pelo caso, explica que os três indivíduos: duas mulheres e um homem, viviam em união estável e desejavam declarar essa situação publicamente para a garantia de seus direitos. Os três procuraram diversos tabeliães que se recusaram a lavrar a declaração de convivência pública. 'Quando eles entraram em contato comigo, eu fui averiguar se existia algum impedimento legal e verifiquei que não havia. Eu não poderia me recusar a lavrar a declaração. O tabelião tem a função pública de dar garantia jurídica ao conhecimento de fato', afirma.

Ela conta também que se sentiu bastante a vontade para tornar pública essa união envolvendo três pessoas, já que havia um desejo comum entre as partes, se tratava de pessoas capazes, sem envolvimento de nenhum menor e sem litígio. 'Internamente não havia dúvida de que as três pessoas consideravam viver como entidade familiar e desejavam garantir alguns direitos. Minha dúvida é com as questões externas à relação. Não há legislação que trate sobre o assunto. A aceitação envolve a maturação do direito.

Nesse caso, foi preciso atribuir o direito a partir de um fato concreto. Será que haverá algum questionamento?' reflete.

Para a vice- presidente do Instituto Brasileiro de Família, IBDFAM, Maria Berenice Dias, é preciso reconhecer os diversos tipos de relacionamentos que fazem parte da nossa sociedade atual. 'Temos que respeitar a natureza privada dos relacionamentos e aprender a viver nessa sociedade plural reconhecendo os diferentes desejos', explica.

Maria Berenice não vê problemas em se assegurar direitos e obrigações a uma relação contínua e duradoura, só por que ela envolve a união de três pessoas. 'O princípio da monogamia não está na constituição, é um viés cultural. O código civil proíbe apenas casamento entre pessoas casadas, o que não é o caso. Essas pessoas trabalham, contribuem e, por isso, devem ter seus direitos garantidos. A justiça não pode chancelar a injustiça', completa.

A escritura

'Os declarantes, diante da lacuna legal no reconhecimento desse modelo de união afetiva múltipla e simultânea, intentam estabelecer as regras para garantia de seus direitos e deveres, pretendendo vê-las reconhecidas e respeitadas social, econômica e juridicamente, em caso de questionamentos ou litígios surgidos entre si ou com terceiros, tendo por base os princípios constitucionais da liberdade, dignidade e igualdade.' A frase retirada da Escritura Pública Declaratória de União Poliafetiva resume bem o desejo das partes em tornar pública uma relação que consideram familiar e de união estável. A partir dessa premissa, a escritura trata sobre os direitos e deveres dos conviventes, sobre as relações patrimoniais bem como dispõe sobre a dissolução da união poliafetiva e sobre os efeitos jurídicos desse tipo de união.

A partir da união estável, a escritura estabelece um regime patrimonial de comunhão parcial, análogo ao regime da comunhão parcial de bens estabelecido nos artigos 1.658 a 1.666 do Código Civil Brasileiro. Nesse caso, eles decidiram que um dos conviventes exercerá a administração dos bens. Dentre os direitos e deveres dos conviventes está a assistência material e emocional eventualmente para o bem estar individual e comum; o dever da lealdade e manutenção da harmonia na convivência entre os três. (Assessoria de Comunicação do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família - www.ibdfam.org.br/novosite)

Pietro Alarcão Bortolli Raposo
Paula Camille Serêjo Cid Oliveira

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Supremo Tribunal Federal manda libertar Taradão (o assasino de Dorothy Stang)


Acusado de ser um dos mandantes do assassinato da missionária Dorothy Stang, Regivaldo Pereira Galvão, o “Taradão”, deverá sair hoje da cadeia. Ontem à tarde, seus advogados conseguiram, no Supremo Tribunal Federal (STF), liminar em habeas corpus deferida pelo ministro Marco Aurélio em favor do fazendeiro. A decisão judicial o coloca imediatamente em liberdade até o julgamento do mérito do HC. A decisão foi comunicada, na tarde de ontem, ao Tribunal de Justiça do Pará. “E a soltura somente deverá ocorrer hoje, após os trâmites burocráticos entre o TJE e a Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará”, informou, ontem, o advogado Jânio Siqueira, que impetrou a liminar juntamente com o advogado José Eduardo Alckmin.

Regivaldo encontra-se encarcerado desde o julgamento do recurso de apelação por ele interposto, no dia 6 de setembro de 2011. Ele foi preso por ordem da 1ª Câmara Criminal Isolada, cujos desembargadores entenderam que, negado seu recurso, era cabível desde logo a prisão do fazendeiro. O advogado Jânio Siqueira lembrou que, na “maratona judicial” em busca da liberdade de seu cliente, primeiro foi interposto um HC no Superior Tribunal de Justiça. Este foi negado pelo STJ no dia 22 de maio de 2012.

Em seguida, em junho, a defesa buscou amparo no Supremo Tribunal Federal, “que, somente agora, se manifestou através de decisão liminar, deferindo a soltura do acusado, que, atualmente, se encontra preso no Centro de Recuperação de Altamira”, explicou Jânio. Ele citou os argumentos utilizados pelo ministro Marco Aurélio em favor da soltura de Regivaldo. Segundo o ministro, o Tribunal de Justiça do Pará não levou em conta a decisão do Supremo Tribunal Federal dada em favor do acusado em junho de 2006, que o colocou em liberdade por força de habeas corpus e cuja decisão dava a liberdade ao fazendeiro para responder solto ao processo até o seu trânsito em julgado – ou seja, até que sobreviesse uma eventual sentença condenatória transitada em julgado.(Jornal O Liberal. Edição: 22 de agosto de 2012)

Caro Marco Aurélio de Mello, com a devida venia, vossa excelência não detêm outros afazeres?

Graças ao nosso exemplar Ministro, o algoz da missionária norte-americana Dorothy Mae Stang (assassinada brutalmente, com seis tiros, um na cabeça e cinco ao redor do corpo, aos 73 anos de idade), Regivaldo Pereira Galvão, carinhosamente alcunhado de Taradão, está livre, quiçá satisfazendo seu “libido de sangue” novamente. Como já havíamos dito em outras oportunidades a prisão definitiva no 'Brasil', ocorre somente após o trânsito em julgado da sentença. Percebe-se nitidamente que sentença condenatória de “Taradão” poderia ser alvo de possíveis recursos da defesa. Ante isso recorreu-se, e conseguiu-se um habeas corpus, libertando mais um transgressor de sua prisão provisória. A nação aplaude sua decisão. Espera-se pelo próximo feito emanado do Supremo Circo Federal. Já adianto, a pantomima “mensalão”!

Sem margem de dúvida, uma situação repugnante. Nossa credibilidade face a nossa Suprema Corte não é uma das melhores. E a cada novo episódio constata-se de fato, com o perdão da palavra, que estamos “lascados”.

Tomo posse das escritas do magnífico Leandro Fontes do Carta Capital, que preconiza:

O STF está se especializando em libertar facínoras com base em chicanas jurídicas. É o efeito Gilmar Mendes, ministro que ganhou fama pelos dois HCs ultrassônicos para o banqueiro Daniel Dantas e um extra para outro taradão, o médico Roger Abdelmassih, condenado a 278 anos de cadeia por ter estuprado 37 mulheres. Dantas está solto. Abdelmassih, foragido.

Marco Aurélio já havia sido reconhecido por feito semelhante, ao libertar o ex-banqueiro Salvatore Cacciola, que ficou sete anos foragido, até ser preso em Mônaco, em 2007.

Não é hodierno, decisões asquerosas como tais. Essas decisões, são desrespeitas em relação a nação brasileira, que corresponde a uma das mais sofridas do mundo, literalmente. Imaginem o pai de família que deixa sua família em casa pela parte da manhã, e sai para “ganhar o pão de cada dia”, ao regressar, avista sua família ceifada, supervenientemente descobre-se que o magareth havia recebido soltura resultante de um habeas corpus devidamente impetrado. Deplorável.

Empraza-se outra vítima dessa corja fétida de meliantes: “A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça por toda parte.” (Martin Luther King Jr.)

A impunidade reinou mais uma vez. Vale ressaltar as proporções internacionais do “caso Stang”, por isso a “justiça” foi feita, de forma manquitola, mas foi. Idealizem os casos sem proporções principescas. Hilário, para não se tornar lamentável.

Colocando a razão em xeque, percebe-se que a culpa direta, não necessariamente é do Ministro, mas do 'irracional' ordenamento jurídico vigente. Em outros países 'racionais' a prisão definitiva acontece no momento da condenação.

Além do vicioso Código de Processo Civil e do defasado Código Penal, reformem, idem, o Código de Processo Penal, por obséquio.

De qualquer forma, nossos legisladores não sabem fazer leis. Portanto, chega-se no “x” da querela, não existe “válvula de escape”, o povo brasileiro está cercado de despreparo e incompetência. O Brasil caminha ao encontro do total fracasso. A mudança deve ser política!


Não vou fugir e nem abandonar a luta desses agricultores que estão desprotegidos no meio da floresta. Eles têm o sagrado direito a uma vida melhor numa terra onde possam viver e produzir com dignidade sem devastar.” (Dorothy Mae Stang)

Paula Camille Serêjo Cid Oliveira
Pietro Alarcão Bortolli Raposo

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Obesidade infantil: questão de Estado ou de paternidade responsável?

Quem porventura auscultou a expressão popular: “falou pouco, mas falou bonito”. Nosso foco consiste exatamente no que tange essa expressão. Despretensiosamente, ao navegar na internet, encontramos um precípite artigo, não obstante por demais tempestivo. Artigo esse da autoria de Vitor Guglinski, exímio jurista, o qual dá-nos o seu parecer, que segue ipsis litteris:

Notícia veiculada no site do Jornal Hoje, da TV Globo, informa que um pai registrou um Boletim de Ocorrência contra sua ex-esposa, alegando que ela pratica maus tratos contra a filha de 6 anos de idade, que pesa 55 kg, enquanto, nessa idade, uma criança normal deveria pesar, em média, 20 kg. (http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2012/08/pai-registra-boletim-de-ocorrencia-porque-filha-esta-acima-do-peso.html).

No ano de 2008, nos EUA, autoridades do Condado de Cuyahoga, que tem Cleveland como sede, decidiram tirar a guarda de uma mãe cujo filho de 8 anos pesava 90 kg, por não conseguir fazer com que ele emagrecesse. Nesse caso, uma criança com idade de 8 anos deveria pesar em média 27 kg.

A questão da obesidade infantil tem despertado a atenção de autoridades médicas e da sociedade em geral, e, ao que parece, o Estado começa a ser chamado a se pronunciar sobre esse importante tema.

No final de 2011, a Fundação Procon-SP, após apurar denúncias do Instituto Alana, que desenvolve atividades ligadas ao consumo infantil, aplicou uma multa de mais de R$ 3 milhões ao McDonald's, por vincular a oferta de lanches a brinquedos, o que, segundo argumenta, cria uma lógica de consumo distorcida nas crianças, consequentemente favorecendo o agravamento desse quadro de obesidade inantil, já que as crianças, atraídas pelos brindes, consumiram mais alimentos inadequados à uma dieta saudável.

Segundo estatísticas, atualmente cerca de 11% das crianças brasileiras são obesas – número que está se aproximando da taxa norte-americana -, que é de 17%; um número considerado alto pelos médicos. Mas, essa questão é assunto de Estado ou deve ficar adstrito à esfera dos pais?

A rigor, nosso ordenamento jurídico não prevê qualquer tipo sanção estatal nos casos em que os pais permitem aos filhos consumir esse ou aquele tipo de alimento. O art. 227 da Carta Fundamental estatui que 'é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao joven, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

É cediço que a atuação do Estado, nesses casos, é implementada por programas, haja vista a natureza das normas constitucionais que versam sobre o tema (normas programáticas). Em outras palavras, significa dizer que não há como as instituições governamentais interferirem de maneira direta no âmbito familiar, até mesmo porque a própria Constituição Federal, bem como a lei civil, tratam do exercício do pátrio poder. Sobre o tema, JOSÉ AFONSO DA SILVA discorre com propriedade:

'A paternidade responsável, ou seja, a paternidade consciente, não animalesca, é sugerida, Nela e na dignidade da pessoa humana é que se fundamenta o planejamento familiar que a Constituição admite como um direito de livre decisão do casal, de modo que ao Estado só compete, como dever, propiciar recursos educacionais e científicos para o seu exercício. A Constituição não se satisfaz com declarar livre o planejamento familiar. Foi mais longe, vedando qualquer forma coercitiva por parte de instituições sociais ou privadas.' (Curso de Direito Constitucional Positivo, 14ª ed., São Paulo, Malheiros, p. 775).

Nesse sentido, o Estado possui, então, função sócio-educativa complementar, através, por exemplo, da definição dos cardápios das escolas públicas, cumprindo sua parte dentro das diretrizes constitucionais. Em linguagem popular, seria como dizer aos pais algo como: 'Senhores pais, aqui na minha área os seus filhos vão comer o que eu oferecer, pois, com isso, queremos evitar que eles sejam obesos.' Ou seja, na esfera de atuação direta do Estado, este é livre para definir sua "política alimentícia'. Dessa forma, fica evidente que o Estado, em regra, não possui legitimidade para interferir nese tipo de questão.

Contudo, parece-nos que esse panorama está prestes a mudar. A não interferência estatal, a nossos olhos, não é absoluta, devendo o Estado intervir quando a negligência parental revelar-se prejudicial à criança, como ocorre nesses casos. Advirta-se, entretanto, que essa intervenção somente se legitima em casos excepcionais, em que a sua saúde da criança é colocada em risco extremo, como ocorre quando a criança suporta um peso que excede em mais de 100% do que o considerado normal. E ainda: deve ser cabalmente comprovado que a situação da criança possui relação direta com a negligência dos pais ou de algum deles.

Resumidamente, em nossa opinião, é tanto questão de paternidade responsável quanto de Estado. Falhando os pais, deve o Estado intervir, pois a dignidade humana é superprincípio fundante da República, sendo cediço que os direitos existenciais são indisponíveis, merecendo ampla proteção, e, além disso, há algum tempo a tese da eficácia horizontal dos direitos fundamentais vem ganhando força. Assim, a liberdade dos pais não pode chagar ao ponto de impedir a força estatal, de modo a sacrificar os legítimos interesse da criança, previstos no art. 227 da CF/88.

Finalmente, registre-se que estas são apenas breves reflexões sobre o tema, o qual possui considerável amplitude.” (http://juristas.com.br/informacao/revista-juristas/obesidade-infantil-questao-de-estado-ou-de-paternidade-responsavel/1245/) (singelas alterações nossas) (sic)

Sobre o Autor (Vitor Guglinski):
- Advogado.
- Pós-graduado com especialização em Direito do Consumidor.
- Ex-assessor do juiz da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora-MG (2006-2010).
- Colaborador permanente a convite da COAD/ADV.
- Seminarista convidado pelo INPA – Instituto de Pesquisas aplicadas do Ceará. Autor de artigos e ensaios publicados nos principais periódicos jurídicos especializados.
- Professor-conteudista da rede Atualidades do Direito (http://atualidadesdodireito.com.br/vitorguglinski/).
- Currículo Lattes: (http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4246450P6).

Paula Camille Serêjo Cid Oliveira
Pietro Alarcão Bortolli Raposo